quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Morte, velório, enterro e culto

Na madrugada de 2 de abril de 1983 (aproximadamente às 4:00 horas)[20], as funções vitais de Clara começaram a desaparecer.[21] Maria Pereira Gonçalves havia acabado de chegar à clínica, após uma visita rápida a Caetanópolis para organizar a casa. Ao entrar no CTI, ela percebeu que Clara não sobreviveria àquele dia. Chegou perto da irmã e lhe disse: "Estou aqui filhinha, você estava me esperando, não é? Agora você pode se desligar, pode seguir teu caminho". Pouco depois, às 4:30 da manhã, Clara morreria após passar 28 dias em coma.[21] Maria Pereira e Paulo César entraram em contato com o presidente da Portela, Nezinho, para que o corpo fosse velado na quadra da escola de samba, em Madureira.[20] De madrugada, as emissoras de rádio anunciaram a morte da cantora e os fãs se dirigiram para a porta da clínica e, posteriormente, para o chamado Portelão.[20] Desde as 6:00 da manhã, uma pequena multidão se formava na porta da escola de samba.[22]

Como medida de segurança, o corpo de Clara saiu de uma ambulância da Clínica São Vicente rumo à quadra da Portela, sendo acompanhado por populares. O corpo chegou à sede da escola de samba às 10:30 da manhã.[20] Com dificuldade, a ambulância entrou no pátio lotado e o corpo foi levado do veículo até uma sala onde estava o caixão.[20] Seis soldados da Polícia Militar conduziram o caixão até o centro da quadra, sob o aplauso das mais de 5.000 pessoas que ali se aglomeravam.[20] Enquanto isso, a programação das principais redes de televisão do país era interrompida com flashes ao vivo da clínica e da quadra da escola de samba;[21] nas rádios, os sucessos do último álbum de Clara, Nação, tocavam incessantemente.[22]

A partir do momento em que o caixão aberto foi colocado no centro da quadra, alguns tumultos ocorreram.[20] Àquela altura, apenas 30 soldados da Polícia Militar faziam a segurança do local, assim como os seguranças particulares da Portela.[20] Seis seguranças da Rede Globo também estavam presentes no local e agiam com truculência, afastando público e repórteres do centro da quadra.[20] Algumas das pessoas presentes caíram de um palco de cerca de dois metros de altura.[20] Houve correria, com muitos empurrões e quedas.[20] O recinto onde se realizaria o velório foi invadido e o caixão quase foi jogado ao chão.[20] Logo depois houve um segundo tumulto, com pessoas correndo para a rua.[20] Alguns passaram mal e pelo menos uma pessoa desmaiou por falta de ar.[20] A diretoria da Portela, incapaz de controlar a situação, se refugiou numa sala junto com a família da cantora.[20] O Batalhão de Choque da Polícia Militar foi acionado para conter a multidão.[20] Ao todo, 50.000 pessoas passariam pela escola de samba para se despedir da cantora.[22][23]

"Não tenho culpa da morte de Clara. Apenas alertei para o risco que ela estava correndo, uma vez que estava ausente da minha casa. Mas ela poderia se cuidar com qualquer outro pai-de-santo (...) O que me espantava era que ela foi coroada por mim como filha das águas e recebeu o título de Deusa das Águas porque todo trabalho foi feito no Rio Capibaribe. Depois de sua ausência do Palácio de Olinda, ela virou guerreira de Ogum com Iansã. Então, como é que eu poderia fazer alguma coisa por ela?"
— Pai Edu de Recife, após a morte da cantora.[24]

Às 16:00 horas, o caixão foi fechado e coberto com as bandeiras do Clube do Samba e da Portela; além das de outras escolas de samba, como Mangueira, Caprichosos de Pilares e Império Serrano. Um caminhão do Corpo de Bombeiros levou o caixão até o Cemitério São João Batista, onde a cantora foi sepultada às 18:00 horas,[22] após um tumulto na chegada ocasionado pela grande quantidade de pessoas que se dirigiram para o local.[24]

As reações à morte da cantora foram variadas. Os seguidores das religiões afro-brasileiras reagiram mal à morte da cantora, dizendo que ela havia sido imprudente ao se operar na quaresma.[21] O babalorixá Pai Edu de Recife, que já havia se desentendido com Paulo César, havia alertado publicamente a cantora para que não se operasse naquele período. Clara teria, inclusive, optado pela anestesia geral – ao invés da peridural – devido a uma orientação que o guia espiritual pernambucano teria lhe dado.[24] Por outro lado, no âmbito do neopentecostalismo, a morte da cantora foi apontada como consequência da intercessão de um espírito demoníaco. De acordo com Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, "o espírito que estava nela foi manifestado por uma pessoa presente" num culto da igreja e teria dito que "iria levá-la".[25]

Já no dia seguinte ao enterro de Clara Nunes, sua sepultura tornou-se um local de peregrinação dos fiéis do candomblé e, desde então, é bastante visitado, sobretudo por adeptos dos cultos afro-brasileiros, que ali realizam rituais e deixam oferendas à artista.[24] De acordo com os adeptos dessas crenças, a cantora não teria morrido, mas sim se tornado um "Ser de Luz", havendo até mesmo relatos de curas através da intercessão de Clara Nunes.[24]

Segundo o jornal O Globo, o túmulo de Clara Nunes é atualmente o segundo mais visitado do Cemitério São João Batista durante o feriado de Finados, atrás apenas do túmulo de Cazuza.[26]

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